Gelmirez e o Compostelanismo foram fulcrais para o futuro da nossa Língua: Eles colocaram os alicerces para que na Galiza nascera Portugal

A Compostela19 de Gelmirez não aceita a condição de primaz de Braga, e por tanto o
seu submetimento a Braga, e entra em conflito com ela20
Braga era o cerne da Galiza, desde que os romanos a converteram na capital da província, e
os Suevos na capital do seu estado. Era a cabeça da Igreja e das ordens religiosas. Após a
invasão muçulmana da península, delega-se o poder eclesiástico de Braga na diocese de
Lugo, como lugar mais seguro, e que ficava mais fora do controle muçulmano21
O Rei Garcia da Galiza, aquele que no 1071 suprimiu o Condado Portucalense, também se
encarregou de que Lugo devolvesse os poderes a Braga22. Ele restaura a cidade, e converte-a
de novo no cerne do reino. De essa política de Garcia não gosta a apostólica sede que nesse
momento estava nascendo.
O bispo Gelmirez tece uma rede de poder, com o ouro que as peregrinagens levam a
Compostela -e apoios, na sua condição de Sé apostólica-.
Quando em 1107 falece Raimundo de Borgonha, quem estava destinado por Afonso VI a ser
o rei da Galiza, oferece a sua proteção e acolhida a Urraca e ao seu filho. Urraca também
recebe o apoio da poderosa casa dos Trava aliada de Gelmirez.
Em 1109, falece o rei Afonso VI, e Compostela imediatamente age para que ela seja
reconhecida como Imperatriz da Galiza, e também dos demais territórios que estavam sob a
coroa do seu pai, mas o seu pai antes de morrer arranjara o matrimonio da sua filha com
Afonso o Batalhador de Aragão, que o exige com as armas, e até ameaça Compostela23
Esse matrimonio vai resultar na perda de influência de Compostela/Gelmirez, e ele reage:
-Tinha com ele, na sua condição de tutor, a Afonso Reimundes, o filho de Urraca e Raimundo de Borgonha-. E -apoiando-se na vontade de Afonso VI, responde, coroando em
Compostela em 1111, como rei da Galiza e Toledo24, a Afonso o filho de Urraca25, -como
Afonso VII- que era uma criança -duns 7 ou 8 anos 26
.
Neste rei, pretende achar Gelmirez um poderoso instrumento para as suas ambições
peninsulares, nas que Compostela27 aspira a ser a cabeça, além da Galiza, da península toda
se puder.
Era tal o desejo de Compostela de estar a cima de Braga, que Gelmirez compra com ouro
ao papado28 a mitra arzobispal e o submetimento a ele (Compostela), de parte das dioceses
que respondiam ante Braga, mas nem assim lhe chegava para ganhar o respeito e o prestígio
a que aspira.
No ano 1102 Braga conseguiu a condição de arcebispado, e além disso conseguiu de
Henrique de Borgonha, que tinha direitos sobre a cidade, que estes lhe fossem entregues na
sua totalidade a ele como arcebispo de Braga.
Gelmirez responde a isso e organiza nesse ano o assalto noturno a Sé de Braga e a outras
igrejas da localidade, para roubar e trazer para Compostela os venerados restos dos santos
que ali estavam -Frutuoso, Susana, Cucufate, Silvestre e alguns outros (A Frutuoso e Susana
mandou Gelmirez erguer sendas igrejas em Compostela). Tentava assim. de ganhar o
prestígio da vero caput para Compostela29
.
Braga conseguiu do Papa Pascual II a disposição que ordenava o retorno do roubado, mas
só na derradeira década do século XX se assinou a paz entre Braga e Compostela em
presença do Papa João Paulo II. Compostela pôs como condição para a paz, não ter que
devolver a Braga a integridade do roubado, só parte dos restos, e a outra parte seguiria em
Compostela, cousa que Braga acabou por aceitar30
Os bispos de Braga afirmam-se contrários as pretensões de Compostela desde que
Compostela age para ser primaz. E a Braga primaz, não aceita ser desconsiderada por essa
recém chegada de Compostela, que age contra ela, em todo momento.
Nisso esta a isca da fratura da Galiza e da independência e nascimento do reino de
Portugal.
Em Braga começa a se dar uma conjunção de soma de interesses, entre o bispo de Braga,
verdadeiro fator do processo que virá, e as classes dominantes locais31. Além disso o
“totalitarismo” de Gelmirez faz o resto.
O arcebispo de Braga é perseguido por Gelmirez utilizando o poder real
A viúva de Henrique de Borgonha, Teresa32, que mora em Guimarães, tem uma posição
favorável à Gelmirez, além disso relaciona-se com o Conde de Trava -outro aliado de
Gelmirez, que era o responsável de Viseu e Coimbra, e localidades mais ao sul.
Em 1120, sob a direção do arcebispo de Braga, o menino Afonso Henriques que tinha na
altura uns doze anos, tomou uma posição política oposta à da mãe33
.
Como resultado dessa posição, o arcebispo de Braga Paio Mendes é forçado a deixar Braga
e ir desterrado34, mas levou consigo o infante35, do que era tutor. Em 1122 armou-o cavaleiro
em Tui36. Pacificadas as tensões, voltará de arcebispo para Braga.
Entretanto, novos incidentes locais provocaram a ação na contorna de Braga do rei da
Galiza, Afonso VII.
A Sé de Braga usa o seu pupilo37 Afonso Henriques, e Gelmirez a Afonso VII38, na luta
incansável que travam. Em 1127, Afonso Henriques vai ser cercado em Guimarães, para que
se submeta ao rei. Porém ao estar montando o cerco, sabe que faleceu a sua mãe Urraca rainha de Leão e que a ele corresponde esse reino, pelo que abandonará o cerco39. Para
Afonso VII, ser rei em Leão, e proceder a recuperar a coroa de Castela, que usufruía
Aragão40, passa a ser central. Com isso, vai por fim libertar sua pessoa do controle
estremado a que estava submetido por Compostela, e cada dia vai ficar mais longe e
menos interessado nesses assuntos, pois Afonso VII ao título de rei da Galiza e de Toledo
acabara somando, os reinos de Leão e de Castela, e o centro dos seus interesses deslocara-se
geograficamente, sendo isso também determinante na fratura da Galiza e o nascimento do
reino de Portugal.

A batalha de São Mamede
Uns meses depois estalam de novo as tenções entre Afonso Henriques, que na altura tinha já
uns 20 anos, e sua mãe41. Em 1128, enfrentam-se tropas de Teresa e Fernão Peres de Trava,
com as de Afonso Henriques na batalha de São Mamede (batalha na que participaram uns
poucos centos de homens, tendo as tropas do nosso rapaz, a bênção e o guia do bispo de
Braga, que achegou homens, saído vitoriosas – o que consagrou a sua autoridade no
território portucalense42
O arcebispo, consciente da importância das forças que ameaçavam o poder de Afonso
Henriques, guiou a este no governo, e fez esforços em negociações junto da Santa Sé, com
um duplo objetivo: por um lado, alcançar a plena autonomia da Igreja de Braga 43
,
recuperando dioceses44 das que perdera o controle (O Pio Latrocínio foi de ajuda). e assim
recuperar a sua condição de igreja metropolitana e primaz, e deixar de estar submetida a
Compostela, e pelo outro lado, obter o reconhecimento do espaço de Portucale como um
reino. E teve sucesso.

.

3 gústame